Escrito por: Diego Cintrão
Servo de Cristo Jesus e defensor do evangelho verdadeiro, sem magia e pirotecnia
Existe uma ideia propagada entre os cristãos “modernos” que a fé em Cristo Jesus nos garante uma vida de sucesso, paz, alegria e benefícios, garantidos pelo amor e bondade de Deus. Os adeptos desse entendimento creem que a vida cristã é isenta de sacrifícios, pois Cristo cumpriu o único e perfeito sacrifício, sua morte na cruz. Creem que somos livres de qualquer dívida, que não há mais nada a pagar, pois Cristo pagou o preço por nós, restando à humanidade o simples ato de reconhecer o Seu sacrifício, adorá-lo e desfrutar de uma vida boa e agradável, abençoados e vitoriosos. Pregam o Cristo que morreu para sermos livres da condenação do pecado e que através desse Cristo temos a garantia de uma vida prospera e sem sofrimento. Em algumas igrejas é comum encontrarmos o slogan “Pare de Sofrer!” ou então campanhas que asseguram as bênçãos materiais na vida daquele que é fiel a Jesus Cristo.
Mas será que o sofrimento de Cristo teve como objetivo a salvação de nossa alma de uma vida sem Deus e ainda assegurar uma vida terrena plena? Será que as dores de Cristo tiveram como objeto me livrar do sofrimento de uma eternidade sem Deus e, além disso, garantir uma vida na terra sem sofrimento? Tentarei nesse texto abordar a participação que verdadeiros cristãos devem ter nas aflições de Cristo Jesus (1Pe 4.13), pensando em um evangelho focado em sua raiz, totalmente descolado da magia evangélica que tenta garantir o paraíso terreno.
Mas será que o sofrimento de Cristo teve como objetivo a salvação de nossa alma de uma vida sem Deus e ainda assegurar uma vida terrena plena? Será que as dores de Cristo tiveram como objeto me livrar do sofrimento de uma eternidade sem Deus e, além disso, garantir uma vida na terra sem sofrimento? Tentarei nesse texto abordar a participação que verdadeiros cristãos devem ter nas aflições de Cristo Jesus (1Pe 4.13), pensando em um evangelho focado em sua raiz, totalmente descolado da magia evangélica que tenta garantir o paraíso terreno.
A Carne
Vivemos em uma sociedade predominantemente consumista. Os ideais capitalistas, a vontade de termos do bom e do melhor, de gozarmos uma vida tranquila e confortável tem conquistado o ser humano. Não é a toa que o capitalismo tem sido o sistema dominante em praticamente todas as sociedades do globo, ou pelo menos nas sociedades ditas dominantes, pois o ser humano é naturalmente consumista, pois são da natureza humana a avareza, o egoísmo e a ambição. Ninguém ensina a gente a ser consumista, ninguém nos ensina a sermos egoístas. Temos que ser ensinados a compartilhar, pois a preocupação com o outro não está em nossa natureza, os princípios do capitalismo já fazem parte da nossa cultura. E aqueles que combatem esse sistema de valorização de bens e capital vivem em uma espécie de policiamento pessoal, para não acabarem vencidos por essa lógica do consumo. Exemplos de pessoas que antes defendiam bandeiras de maior solidariedade, do sonho socialista de um mundo sem desigualdades sociais e que se “venderam” a ideia da acumulação são frequentes. Isso porque não há convicções que resistam ao bem estar da nossa carne, pois é bom demais poder satisfazer as vontades do nosso corpo. A minha natureza se regozija com a possibilidade de usufruir de todo o conforto e praticidade que o dinheiro pode me dar. Essa é a lógica do mundo que vivemos, esse é o sistema que impera no mundo que a Igreja de Jesus Cristo está edificada.
Porém minha intenção aqui não é discutir os sistemas de produção e sua eficácia, ambos, tanto o Capitalismo quanto o Socialismo, não possuem a Verdade, a Verdade está no Evangelho. Quero sim analisar o quanto os cristãos desse século tem internalizado e supervalorizado ideais, que para o evangelho não tem valor algum. Como é comum ouvir de cristãos, que estão há anos dentro de uma igreja, afirmarem que tem como sonho possuir uma grande e bela casa, que tem como plano adquirir um carro zero quilometro, ou ainda, um carro importado, ou mais de um carro. Cristãos que se deslumbram com o fato de um colega possuir uma bela casa de praia, ou sonham com uma viagem para Miami, que querem lutar por uma vida confortável, e muitos outros desejos que refletem os valores consumistas que imperam em nossa sociedade. Temos crescido com a ideia de que cristão bem sucedido é cristão abençoado por Deus, ou seja, rico (prospero). Mas será que era isso que Cristo tinha em mente quando decidiu enfrentar a cruz?
Em João 3:3 Jesus declara a Nicodemos, um importante membro do Sinédrio, “Em verdade, em verdade te digo, se alguém não nascer de novo, não pode ver o reino de Deus.”. Questionado por Nicodemos como seria possível um homem voltar a nascer, Cristo responde em João 3.5 “Em verdade, em verdade te digo: quem não nascer da água e do Espírito não pode entrar no reino de Deus.”. Ou seja, o Senhor está afirmando que apenas através do arrependimento e da implantação da vida do Espírito em nós haverá salvação. Mas, no que consiste esse novo nascimento?
Cristo salienta que o homem natural, focado nas coisas da sua natureza, sujeito a todo desejo e gozo que o mundo pode oferecer, não encontrará a salvação. Ou seja, quando Cristo nos orienta a essa escolha, de nascer novamente, Ele cria nesse nascimento um novo ser através do Espírito Santo, um ser que caminha na contramão da lógica desse mundo, pois nasce uma nova criatura. Em 2 Coríntios 5.17 o apóstolo Paulo escreve que “...se alguém está em Cristo, nova criatura é; as coisas velhas já passaram; eis que tudo se fez novo.”, se antes de Cristo víamos as coisas segundo o ponto de vista humano, agora devemos ver através do paradigma de Cristo. Em 1 João 2:16 está escrito “Porque tudo o que há no mundo, a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida, não é do Pai, mas do mundo.”
O dicionário Houaiss descreveu o termo concupiscência como sendo uma ambição por bens, matérias e luxúria. Aqueles que estão em Cristo devem lutar contra os desejos materiais e do impulso imoderado de satisfazer a sensualidade. No versículo anterior o apóstolo João escreve “Não ameis o mundo, nem o que no mundo há. Se alguém ama o mundo, o amor do Pai não está nele.”, pois aqueles que são de Cristo não pertencem a esse mundo, em João 17:16 Jesus afirma “Não são do mundo, como eu do mundo não sou”. Há como as Escrituras serem mais claras, ou darem margem para outras interpretações? Creio que não! Mas que relação, então, devemos ter com esses desejos suscitados pela nossa natureza carnal?
Na Primeira carta de Pedro a Ásia Menor está escrito “Amados, peço-vos, como a peregrinos e forasteiros, que vos abstenhais das concupiscências carnais que combatem contra a alma (1Pd 2:11)” Comparando aqueles que estão em Cristo como estrangeiros nesse mundo, cuja cidadania está no céu, pessoas que não se curvam a cultura vigente, mas que buscam desenvolver uma cultura celestial na qual o parâmetro é Cristo Jesus. No entanto encontramos, no presente século, cristãos que creem em um Cristo intencionado a suprir os desejos do nosso coração carnal. São cristãos que querem os melhores carros, as melhores comidas, as melhores roupas, os melhores sapatos, as melhores viagens, a melhor conta bancária, ou seja, uma vida boa à nossa carne.
A carta de Paulo aos Gálatas afirma que “..os que são de Cristo Jesus crucificaram a carne, com as suas paixões e concupiscências (5:24)”, sinceramente não consigo ler esse versículo com todo o positivismo carnal que algumas igrejas entendem o evangelho. O Apóstolo Paulo faz uma analogia do ser cristão com a necessidade de uma crucificação constante, não consigo ver esse processo sem dor. Já em 1 Coríntios 9:27 o apóstolo Paulo dá o seu testemunho sobre a conduta dele frente a carne quando afirma “mas esmurro o meu corpo e reduzo à escravidão, para que, tendo pregado a outros, não venha eu mesmo a ser desqualificado.”, não visualizo nesse versículo uma vida cristã de paz e tranquilidade no Senhor. Por que Paulo não escreveu que bastava uma corrente de sete semanas, ou então semear uma oferta generosa, para que Jesus resolvesse seus problemas? Ao invés disso, Paulo usa outra analogia que relata dificuldade, esmurrar o corpo requer dor para reduzir os nossos desejos a escravidão em Cristo. Ou seja, ao invés de correr para satisfazer meus planos, meus sonhos, devo esmurrar as ambições materiais da minha natureza humana, para que em mim Cristo seja exaltado sobre todas as coisas.
A Palavra de Deus é clara e sem margem para numerosas interpretações, a relação que temos que ter com nossa carne é de conflito, uma espécie de policiamento pessoal, baseado nas Escrituras. Devemos estruturar essa relação conflituosa, entre o que é carnal e o que é espiritual, na raiz no cristianismo, primeiramente em Cristo Jesus e nos escritos dos apóstolos, e não em teorias baseadas no materialismo exacerbado recheado de técnicas de pensamento positivo e magia clientelista. O cristianismo autêntico requer sacrifício, requer a participação genuína nas aflições de Cristo, aflições que nos farão sofrer.
O Sofrimento
Com certeza todo o cristão está sujeito a toda sorte de sofrimento, sofrimento que qualquer ser humano pode enfrentar. O cristão está sujeito a dor da perda de um parente amado ou um grande amigo, sujeito a doenças, desde uma gripe muito forte até uma doença terminal, cristãos estão sujeitos ao desemprego, acidentes, etc. Conheci homens e mulheres fiéis a Cristo Jesus que sofreram até a morte, por decorrência de doenças graves, mas que foram lembrados não pela dor e sofrimento que passaram durante o processo, mas por terem exaltado o nome de Deus até o último suspiro de vida. Ou seja, no cristianismo autêntico não existe essa fórmula mágica, que lhe dá instruções para ter uma vida sem essas dificuldades que todo o ser que habita nesse mundo está sujeito, o que existe são homens e mulheres que conhecem a Deus e que conseguem reconhecer a mão de Deus até mesmo nas dificuldades e o glorificam em todo o processo. Porém não quero me ater aos sofrimentos comuns a todos os homens, quero atentar para os sofrimentos reservados àqueles que servem a Jesus Cristo.
No livro de Atos dos Apóstolos encontramos a história de Estevão, que é considerado o primeiro mártir do cristianismo. Estevão, discípulo de Cristo, era um grande evangelista, pregava o evangelho em Jerusalém e a mensagem de Cristo propagada por ele converteu inúmeras pessoas, o que suscitou ira dos judeus religiosos, os quais o acusaram de inimigo do Templo e o condenaram a morte. No capítulo 7 de Atos encontramos o discurso de Estevão que sabendo da inevitabilidade de sua morte utiliza aquele momento, proposto para sua defesa, para proclamar o evangelho e glorificar ao Senhor Jesus Cristo. Em Atos 7:55-59 vemos a descrição de sua morte: “Mas ele, estando cheio do Espírito Santo, fixando os olhos no céu, viu a glória de Deus, e Jesus, que estava à direita de Deus; E disse: Eis que vejo os céus abertos, e o Filho do homem, que está em pé à mão direita de Deus. Mas eles gritaram com grande voz, taparam os seus ouvidos, e arremeteram unânimes contra ele. E, expulsando-o da cidade, o apedrejavam. E as testemunhas depuseram as suas capas aos pés de um jovem chamado Saulo. E apedrejaram a Estêvão que em invocação dizia: Senhor Jesus, recebe o meu espírito.”. Estevão, um homem cheio do Espírito de Deus, fiel, discípulo de Cristo Jesus, teve como participação nas aflições de seu Senhor ser apedrejado até a morte. Nada poupou esse homem de passar pelas mais duras aflições em prol de sua fé. Alguns estudiosos afirmam que Estevão tinha as “feições de um anjo” e que quando falava, era tamanha sua autoridade em Cristo que era impossível não ouvi-lo, porém mesmo assim o mataram.
Em Romanos 8:16-18 está escrito “O mesmo Espírito testifica com o nosso espírito que somos filhos de Deus. E, se nós somos filhos, somos logo herdeiros também, herdeiros de Deus, e co-herdeiros de Cristo: se é certo que com ele padecemos, para que também com ele sejamos glorificados. Porque para mim tenho por certo que as aflições deste tempo presente não são para comparar com a glória que em nós há de ser revelada.”, em outras traduções o termo padecemos é traduzido como sofremos, ou seja, somos co-herdeiros em Cristo se somos de fato participantes dos Seus sofrimentos. O livro de Filipenses ainda é mais claro onde afirma “Porque a vós vos foi concedido, em relação a Cristo, não somente crer nele, como também padecer por ele,” (1:29), os discípulos de Cristo irão sofrer.
“Regozijo-me agora no que padeço por vós, e na minha carne cumpro o resto das aflições de Cristo, pelo seu corpo, que é a igreja;” Colossenses 1:24, Paulo aqui descreve o preço para aplicar o verdadeiro valor do sacrifício de Cristo no mundo. Em prol de cumprir a missão que foi dada a todo aquele que crê em Cristo Jesus, pregar as boas novas, Paulo sofria aflições. Cristo sofreu na cruz para fazer expiação pelos nossos pecados, e Paulo preencheu sua cota de sofrimento cristão ao experimentar os sofrimentos suplementares, necessários para transmitir a mensagem de Cristo. Tais sofrimentos, em Cristo, também estão reservados para nós, em 1 Co 11.1 Paulo afirma “Sede, meus imitadores, como também eu sou de Cristo”, devemos imitá-lo, pois Paulo é um imitador de Cristo, imitador do Cristo sofredor, sendo igualmente sofredor para glória e honra de Deus. O grande proposito de Deus é que todos conheçam a Verdade e que todos sejam moldados, transformados, na semelhança de Cristo e para que isso seja possível é necessário participarmos dos sofrimentos de Cristo.
Considerações Finais
Porém não é esse estilo de vida que vemos na igreja atual. O evangelho hoje disseminado na grande mídia e vivido em muitas de nossas comunidades cristãs é o evangelho da boa vida. Segue-se um Cristo que dá um carro novo, um bom casamento, saúde, roupas caras, um emprego com um bom salário, vende-se um Jesus que garante uma boa recompensa. Está aí o evangelho da prosperidade, que tem aglomerado inúmeros adeptos e que tem contaminado até mesmo as igrejas que defendem o verdadeiro evangelho.
Viver para a prosperidade não traz de modo algum glórias a Deus, viver para essa vida não louva em nada o nosso Senhor. Paulo em 1 Co 15 escreve que “Se esperamos em Cristo só nesta vida, somos os mais miseráveis de todos os homens.”, é exatamente isso que garante o evangelho da prosperidade, esperar em Cristo só nesta vida. O conhecido pregador John Piper disse uma vez “ O evangelho da prosperidade não irá fazer alguém louvar a Jesus. Fará com que pessoas louvem a prosperidade!”, é exatamente o que temos visto acontecer em nosso dias.
Temos nos deparado com uma igreja apaixonada pelo mundo, uma igreja que ama a boa vida, o conforto e os prazeres que a vida pode proporcionar. Uma igreja que tem trocado a sua cruz pelo conforto de carros novos, pisos de mármore e ar condicionado. Não se escuta mais pregações sobre Mateus 16:24 “Então disse Jesus aos seus discípulos: Se alguém quiser vir após mim, renuncie-se a si mesmo, tome sobre si a sua cruz, e siga-me;” , se quer a benção não a cruz. No entanto o evangelho sem a cruz não é evangelho. Que venhamos a aprender a glorificar a Deus pela cruz de Cristo, que nos limpou de todo pecado e nos fez aceitos por Deus, mas também agradeçamos a Deus pela nossa cruz, que nos faz caminhar cada vez mais para junto de Cristo.
Cristo busca discípulos dispostos a negarem-se a si mesmos. Não pessoas que tenham prazer nas superficialidades que o mundo pode oferecer, prazer em esbanjar riquezas que de nada agradam a Deus, “E dizia a todos: Se alguém quer vir após mim, negue-se a si mesmo, e tome cada dia a sua cruz, e siga-me. Porque, qualquer que quiser salvar a sua vida, perdê-la-á; mas qualquer que, por amor de mim, perder a sua vida, a salvará.” (Lucas 9:23-24). Ele busca adoradores verdadeiros, dispostos a sofrerem perseguições por causa no Nome e não pessoas em busca de popularidade, conforto e mordomias que o dinheiro pode comprar.
Cristo busca um estilo de vida que venha impactar os dias de hoje e isso não será possível vivendo o que o materialismo desse século oferece. O evangelho não precisa de pessoas fazendo o que todo mundo faz, consumindo o que de melhor se consome, dirigindo o que de melhor se pode dirigir, vestindo o que de melhor se pode vestir, morando no que de melhor se pode morar e esbanjando uma vida que não é preparada para os Filhos de Deus e sim para os filhos do mundo entregues a suas concupiscências. Tiago 4.4 diz “Infiéis, não compreendeis que a amizade do mundo é inimiga de Deus? Aquele, pois, que quiser ser amigo do mundo constitui-se inimigo de Deus”.
Que nós possamos praticar um estilo de vida que demostre ao mundo que nossos anseios, que nossas riquezas não estão nas coisas terrenas, mas no verdadeiro tesouro que está em Deus “Não ajunteis tesouros na terra, onde a traça e a ferrugem tudo consomem, e onde os ladrões minam e roubam; Mas ajuntai tesouros no céu, onde nem a traça nem a ferrugem consomem, e onde os ladrões não minam nem roubam. Porque onde estiver o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração.” (Mateus 6:19-21).
Que possamos cumprir o que Paulo disse “Não digo isto como por necessidade, porque já aprendi a contentar-me com o que tenho. Sei estar abatido, e sei também ter abundância; em toda a maneira, e em todas as coisas estou instruído, tanto a ter fartura, como a ter fome; tanto a ter abundância, como a padecer necessidade. Posso todas as coisas em Cristo que me fortalece.” Filipenses 4:11-13
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